quarta-feira, 21 de abril de 2010

Ayahuasca


Ayahuasca
Em meio às polêmicas, Santo Daime pode virar patrimônio imaterial
Carolina Rocha

O chá de Ayahuasca serviu como base para o estabelecimento de diferentes tradições espirituais na região da Amazônia. Comunidades indígenas do Peru, Bolívia, Equador e Brasil formularam suas bases doutrinárias sob a influência cultural, social e religiosa do chá. No Brasil, o Ayahuasca foi rebatizado com o nome de “Daime” e símbolos católicos foram misturados ao culto.

Tornou-se, portanto, fundamento de uma nova tradição religiosa, sincreticamente brasileira, transmitida de geração em geração na Amazônia Ocidental. Encarando o Daime como parte indissociável da sociedade brasileira, representantes do Acre, em diálogo com os centros da doutrina Ayahuasqueira, solicitaram ao Ministério da Cultura e ao Iphan o reconhecimento do chá usado em rituais religiosos como Patrimônio Imaterial da Cultura Brasileira. O pedido foi feito em 30 de Abril de 2008, mas até agora nada foi decidido.

O assunto voltou à tona, com força, após o assassinato do cartunista Glauco Villas Boas. Ele fundou a comunidade Céu de Maria, que recebe mais de 400 participantes do Santo Daime nos fins de semana, há cerca de 17 anos. Glauco e sua família conheciam bem as propriedades e os efeitos do Santo Daime e sua morte foi uma fatalidade. Até que ponto o Santo Daime é o responsável? Vários setores da grande mídia têm culpado o chá alucinógeno por levar Carlos Eduardo Sundfeld Nunes, ex-adepto do centro religioso, a assassinar Glauco.

A deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), grande aliada na luta pelo reconhecimento do Daime como nosso Patrimônio Cultural, critica essa postura da imprensa. Segundo ela, tenta-se fazer o réu de vítima e transformar a vítima no culpado por sua própria morte. Ela cobra a realização de estudos acadêmicos sobre o chá e os rituais, para que assim, opiniões equivocadas não sejam transmitidas ao público.

Nesta reportagem do SBT, são apresentadas várias questões ligadas ao reconhecimento do Daime como nosso patrimônio. O samba, o frevo, a capoeira, o jongo... Essas e tantas outras manifestações culturais estão registradas como patrimônio imaterial brasileiro. O objetivo é identificar e proteger nossas riquezas culturais que não são palpáveis. A UNESCO define como patrimônio cultural imaterial “as práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhes são associados e que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural”. Transmitido de geração em geração esse patrimônio é constantemente recriado dentro das comunidades em interação com a sociedade.

Existe um tecido cultural de um povo ligado ao uso do Daime e o reconhecimento do chá como patrimônio imaterial pode proteger seu uso tradicional – religioso -, diferenciando-o de usos descontextualizados. Além disso, seria uma oportunidade de quebrar preconceitos e conhecer melhor os rituais, defendem os ayahuasqueiros. Outros defendem que essa iniciativa pode possibilitar o uso indiscriminado do chá e atrair a curiosidade de muita gente, em busca de turismo, e pouco preocupada com o contexto religioso. Enquanto não temos uma resposta definitiva, são saudáveis as discussões sobre o assunto.